Dois mortos e uma pessoa desaparecida é o saldo até o momento da tragédia do desabamento de parte da ciclovia ma Avenida Niemeyer, em São Conrado, na sul do Rio de Janeiro. Os dois corpos foram retirados das águas ontem, 21,por uma equipe do Corpo de Bombeiros, com o apoio de um helicóptero, que continua fazendo varredura no local em busca de outras possíveis vítimas.
Um dos mortos foi identificado por parentes no Instituto Médico Legal Afrânio Peixoto (IML) como sendo Eduardo Marinho Albuquerque, de 54 anos. De acordo com a assessoria da corporação militar, não havia ainda informação sobre a identificação da segunda vítima. O mar revolto em virtude da forte ressaca dificulta as buscas.
O pescador Damião Pinheiro, de 60 anos, morador da Rocinha, foi testemunha do desabamento de parte da Ciclovia Tim Maia, inaugurada em 17 de janeiro deste ano, envolvendo investimentos da ordem de R$ 44 milhões.
Pinheiro acabava de passar na ciclovia, que frequenta todos os dias da semana em sua profissão, quando ouviu um estrondo e, ao olhar viu parte da estrutura desabar, levando ciclistas e pedestres que estavam no trecho afetado. Ele disse ter parado para ver as pessoas batendo fotos, quando, de repente, veio uma onda, tirou a passarela do lugar e “jogou ela para cima como se fosse um isopor”.
“As pessoas que estavam em cima caíram junto com a passarela, a água que subiu bateu em um ônibus, quebrou os vidros do veículo, e ao descer levou as pessoas com ela”. Muito nervoso, Damião Pinheiro disse ter visto a morte bem de perto. “Eu pensei que também ia [morrer], porque a minha [parte da ciclovia]também balançou”, disse.
O pescador não tem dúvidas que uma nova ressaca poderá por abaixo novos trechos da ciclovia. “Ela não é presa a nada, é solta. Qualquer onda alta que vier no costão vai botar toda a ciclovia no mar”, afirmou.
Responsabilidades
O secretário municipal de Governo do Rio de Janeiro, Pedro Paulo, disse que a prioridade agora é com o resgate das vítimas e a interdição da avenida para evitar riscos de novos desabamentos. “Porque na medida em que você tem esse desabamento aqui, põe em dúvida a segurança de outros pontos que têm a mesma configuração de engenharia”. A Avenida Niemeyer ficará interditada para a circulação de pessoas. O secretário informou que engenheiros, geotécnicos e técnicos irão avaliar as causas “desse acidente imperdoável que aconteceu na ciclovia”.
A prefeitura pretende cobrar responsabilidades da empresa construtora da obra, a Concremat. O prefeito Eduardo Paes, que se encontrava na Grécia para a solenidade de acendimento da tocha olímpica, já está retornando ao Brasil, disse Pedro Paulo.
O secretário municipal de Obras, Alexandre Pinto, acrescentou que é prematuro apontar culpados. Disse que embora toda ressaca seja prevista, somente após a perícia que será feita no local e de posse dos resultados das investigações, haverá elementos para indicar as causas reais do desastre. A fiscalização da obra foi feita pela Geo-Rio, empresa ligada à Secretaria de Obras. “Na verdade, a gente tem que sentir a força da energia dessa onda para poder informar as consequências”. Para o secretário, “não há como dizer claramente agora quais as causas que contribuíram para ter esse acidente”. Apesar disso, ele estimou que os responsáveis são a empresa construtora Concremat e Concrejato e seus calculistas.
Alexandre Pinto declarou que a avenida só poderá ser liberada para os moradores depois que as investigações sobre as causas da tragédia forem concluídas, de forma a garantir segurança para uma a abertura da via.
Nota oficial
Em nota, o prefeito do Rio, Eduardo Paes, lamentou profundamente o acidente e se solidarizou com as famílias das vítimas “e com todos os cariocas neste momento”. O prefeito atenderá a imprensa amanhã (22), assim que chegar ao Brasil, ainda sem previsão de horário.
“É imperdoável o que aconteceu, já determinei a apuração imediata dos fatos e estou voltando para o Brasil para acompanhar de perto”, manifestou o prefeito, que saiu ontem (20) à noite do Rio.
Ainda de acordo com a mensagem divulgada pela prefeitura, os reparos serão executados pela empresa responsável pela construção, sem ônus adicionais ao município, já que a ciclovia ainda está na garantia de obra. A Avenida Niemeyer permanece interditada ao tráfego e o Corpo de Bombeiros continua as buscas no local.
Repercussão
Adriana Rocha é administradora de empresas e mora em São Conrado. Para ela, o acidente causou grande impacto. “A sensação é de que nós não estamos sendo cuidados pelo Poder Público”. Segundo ela, que quando passou pelo local bem cedo já tinha avistado um buraco que foi aumentando. “Me parece erro de projeto. Os engenheiros têm que prever uma maré alta. É lamentável, custou algumas vidas e podia ser um de nós”, disse.
A estudante de medicina Micaela Keller mora na Avenida Niemeyer, ela disse que andou uma vez pela ciclovia. “É bomba. É totalmente despreparada para ter pedestre. As vigas são separadas, tremem. Eu moro aqui há 20 anos e sempre tem onda [alta]. Não tem estrutura nenhuma para receber nada”, afirmou.
O industrial Alberto Bergier, frequentador da ciclovia, não acreditava no que via. “Passo aqui todo sábado e domingo. Aparentemente, a onda deve ter subido e levantou tudo. Isso não pode acontecer. Está com cara de Brasil. Está tudo ruindo mesmo. O país inteiro está caindo”.
Ronaldo Lapa é jornalista e duas vezes por semana passeia pela Ciclovia Tim Maia. Ele demonstrou surpresa diante do acidente. “Não imaginava que isso pudesse acontecer. Para quem fazia ciclismo aqui, era um negócio maravilhoso. Era uma das ciclovias melhores do mundo. Muita gente vinha aqui pela manhã. Virou ‘point’ “.
Lapa garantiu que até hoje, quando ocorreu o desabamento, a ciclovia era considerada por muitas pessoas “o local mais maravilhoso do mundo para passear”. Sua surpresa foi total, assegurou. “Ninguém podia imaginar que uma ressaca podia derrubar uma estrutura construída ao lado do mar que, teoricamente, teria um cálculo bem feito para isso. Foi o mar que derrubou esse negócio mal feito. Uma tristeza”, resumiu.