A obra A escuta singular de Pixinguinha, de Virgínia Bessa, que acaba de ser lançada pela Alameda Editorial, procura desvendar alguns intricados aspectos da trajetória de Pixinguinha. Reconstruindo o painel cultural e musical da capital republicana nas primeiras décadas do século XX, a historiadora procura compreender a multiplicidade de caminhos que se apresentam ao músico e explicita as escolhas feitas por ele nesse rico e aberto painel de tempos e possibilidades históricas.
Como boa parte dos músicos populares do período, “Pixinguinha desenvolveu uma escuta aberta, incorporando em seu repertório os novos ritmos e timbres” presentes na época. Para Virgínia Bessa, essa escuta era ainda parte de uma estratégia de sobrevivência, já que possibilitava sua atuação profissional e a decorrente ascensão social. São justamente alguns elementos dessa escuta singular, revelada nas composições, interpretações e arranjos de Pixinguinha, que ela privilegia como objeto e examina em seu trabalho.
Essa não é uma tarefa simples, pois nesse longo processo o compositor incorporou à sua obra não só a “misturada de gêneros” que, segundo Mário de Andrade, caracterizava a música popular da época, mas também elementos do folclore, influências jazzísticas, discursos da música erudita e até as necessidades das nascentes indústrias fonográfica e radiofônica, já que delas tirava sua sobrevivência.
Essa condição peculiar possibilitou ao compositor participar das diferentes fases de construção do entretenimento musical, desde suas formas incipientes e amadoras do inicio do século XX, até aquelas da indústria da cultura mais organizada. E, em cada uma delas, a “brasilidade” atribuída a Pixinguinha se modificou, tanto na avaliação de seus contemporâneos, como no juízo posterior dos historiadores da música popular. Diante dessa complexidade do indivíduo e da história cultural e musical de que ele participa e é um dos protagonistas, Virgínia Bessa age como historiadora atenta e arrisca uma periodização para compreender melhor o multifacetado compositor e sua época.
Sobre a autora: Virgínia de Almeida Bessa é mestre em História Social pela USP, onde atualmente realiza seu doutoramento, em co-tutela com a Universidade de Nanterre (Paris X). É membro do grupo de pesquisa “Entre a memória e a história da música” e tem se dedicado ao estudo das relações entre música e história, com abordagem interdisciplinar. É autora da coletânea História e música no Brasil (Alameda, 2010).