A norte-americana Nike, grife que homenageia a deusa grega Νίκη que personificava a vitória, força e velocidade, representada por uma mulher alada, tem o espírito olímpico nos pés. E sabe que a vitória, Niké, nem sempre é ser o primeiro a cruzar a linha de chegada, mas sobretudo cumprir o trajeto, a missão a que se propôs. Por isso mesmo, desde a antiguidade as palmas que recebem os últimos a chegar num estádio, no final de uma maratona, têm a mesma força e intensidade com que os últimos são recebidos, pelo esforço que representam: a vitória sobre o corpo que parece entregar os pontos. É isso que aproxima esses corredores do lendário soldado Filípedes que correu os 40 quilômetros que separavam a cidade de Marathóna de Atenas para comunicar aos atenienses que haviam vencido a guerra. Falou “vencemos”e morreu, o filme Last, de Nike, relembra e realça essa informação pontuando que ele morreu, ainda que tenha cumprido a sua missão entrando para história como um vencedor. Pouco importa se durante dois dias percorreu correndo mais de 240 quilômetros como no texto romanceado de Heródoto, levando ajuda de outras cidades ao campo de batalha e só depois disso correndo célere à Atenas para anunciar a vitória. O importante é que Filípedes cumpriu seu objetivo.
Por Yume Ikeda, de Tokyo
É a partir da história do lendário soldado grego que deu origem à prova com percurso oficial de 42,195 km em ruas e estradas,que Nike vai de encontro no filme “Last”, assinado pela Wieden+Kennedy com produção da Park Pictures que, embalado pela canção “Every Little Bit Hurts”, na voz inconfundível de Aretha Franklin, costura uma cena marcada por suor, esforço e vontade de vencer, uma mulher que está por último, mas não desiste. Vai vencer a meta a que se propõe ao se inscrever numa maratona, que é concluí-la ainda que fique para trás, bem para trás. “Você não é um corredor. Você não é, especialmente, um corredor de maratona. Mas no final disto, você será”, diz o texto. Nike busca assim mostrar que todos são importantes e de fato são numa maratona, nesse espírito que une os corredores em várias cidades do mundo.
Trata-se, também, de uma mudança de discurso que tem marcado este ano as grandes grifes como adidas, Puma, Under Armour e Olimpikus, focando mais no consumidor comum e ressaltando que as estrelas do esporte se esforçam, treinam muito, se dedicam diariamente para chegar ao pódio, à perfeição como o filme de adidas estrelado por Arthur Zanetti ou o de Under Armour que mostra a repetição dos exercícios tanto por Misty Copeland, a primeira bailarina do American Ballet Theatre e a primeira negra a ocupar tal posto, como por Tom Brady, o astro dos Patriots e de Super Bowl, casado com a top model brasileira Gisele Bündchen. Nike mostra que você pode também chegar lá, concluir uma maratona, claro que, respeitando seus limites, mas fazendo uso, e é isso que interessa tanto à Nike como às demais grifes, de produtos que ofereçam conforto e que ajudem nesse trajeto até a vitória, o encontro com a deusa Niké.
O uso de astros do esporte na propaganda tem por meta despertar esse desejo aspiracional nos consumidores, uma fórmula garantida de sucesso que é a de mostrar o que os ídolos usam despertando o desejo. Esse discurso, porém, por vezes se desgasta face à repetição no uso, então é preciso, como Nike, voltar ao pelotão que está atrás, onde está a fatia maior de consumidores e reinjetar neles uma dose de esperança de que também fazem parte, que também são vencedores, o que fato são. É esse o trunfo do comercial Last e onde reside sua inegável beleza e também a sua dose mais forte de emoção, apesar de sua extrema simplicidade.