A mudança é sutil, por força da mídia especializada em publicidade e propaganda que depende de grandes nomes do mercado para atestar credibilidade e, assim, atingir novos publicitários e estudantes, mas é real: as grandes estrelas do mercado estão gradualmente saindo de cena. A campanha publicitária assinada pela McCann London para o Festival Internacional de Criatividade Cannes Lions é um sintoma dessa ausência ao sugerir que se mande para o evento os piores profissionais para que saíam de lá melhores.
POR CARLOS FRANCO
A mudança é uma decorrência natural da aquisição das agências genuinamente brasileiras por grandes grupos internacionais. Julio Ribeiro, José Zaragoza, Roberto Duailibi, Washington Olivetto, Alexandre Gama, Fábio Fernandes, Nizan Guanaes, Roberto Justus, Eduardo Fischer, Marcello Serpa, Atila Francucci, Aaron Sutton entre tantos outros de uma constelação de vencedores de grandes prêmios ainda têm e muito peso, mas cada vez mais um contingente de profissionais do mercado publicitário vive uma realidade diferente.
No mercado dominado por grandes grupos, como WPP, Publicis, Omnicom, BBH, S&S e DDB, o que vale é o capital das suas marcas globais como Ogilvy, Y&R, Grey, McCann, Publicis e muito pouco o prestígio pessoal. Esse cacife foi importante, no entanto, para dar valor às marcas nacionais, focadas em seus criativos, planejadores, enfim homens de comunicação comercial.
O Festival Internacional de Criatividade Cannes Lions, onde publicitários do porte de Serpa, Olivetto e Guanaes fizeram fama, trazendo dezenas de leões de ouro, prata, bronze e até Grand Prix na bagagem cada vez mais mostra uma face diferente: de gente jovem e plugada nas novas plataformas de comunicação e, ainda que com pouco ou duvidoso conteúdo, capaz de estabelecer um diálogo com os novos consumidores.
A Microsoft, não sem motivo, é hoje master patrocinadora do mais importante festival mundial. Banca a entrega dos cada vez mais disputados Cyber Lions, onde a turma mais jovem faz a festa, com ousadia e um claro entendimento de planejamento e comunicação que chega ao coração dos jovens. O problema, é muitas dessas iniciativas não chegam a durar um verão.
Então, os grandes nomes, os grandes salários vão se apagando ou se transformando em butiques, que vendem conceitos, assim como o propalado glamour que rondava as estrelas da publicidade, sempre freqüentes em revistas de celebridades, vai perdendo o brilho. A própria cobertura do Cannes Lions cada vez mais se descola dos grandes nomes para as inovações, que podem surgir de qualquer lugar. É claro que os grandes nomes têm muito a contribuir, são os guardiões da memória da propaganda, da sua evolução e são, sobretudo, geniais quando criam, mas hoje a moeda de troca não tem sido mais a criação de qualidade, mas a venda em si.
E se a bonificação por volume, o chamado BV, que é o desconto que veículos de comunicação dão à agências por compra antecipada de espaço e que chegava a representar até 40% do que o cliente pagava para exibir a sua marca também gradativamente sai de cena, a realidade, agora, é menos dourada.
A nova geração de profissionais chega às agências com salários mais baixos, afetados pela concorrência e a oferta de mão de obra. Nas empresas, diretores e gerentes de marketing, querem resultados imediatos, nem chega a ser mais para garantir bônus, mas o próprio emprego. Então, ousadia e criatividade vão entrando para a geladeira e grandes grupos bancarem a criatividade de profissionais é algo hoje ainda mais distante. As estrelas ainda brilham, mas a constelação ainda que maior, agora é das estrelinhas, algumas de um só verão como sorrateiras andorinhas. Sinal evidente dos novos tempos. Mas sempre, como bem ilustra esta coluna, haverá Cannes.