Por Mauro Santayana*
É quando a mentira
domina e prima,
e a indignidade
vira regra,
hábito,
etiqueta,
daqueles que professam,
cultuam,
praticam,
sem necessidade de templo
ou liturgia,
a mais rasteira e porca
hipocrisia,
que o justo busca a razão,
reúne a coragem,
para seguir
na reta travessia.
É quando a injustiça
esquece as normas do Direito,
se rasga a Constituição,
a garantia de defesa,
aceita-se a chantagem,
a pressão,
a violência,
o abuso,
o massacre
e o desvio,
premia-se a delação
e a calúnia,
distorce-se a Lei a serviço
de uns poucos,
enquanto sua espada
só se abate sobre outros,
enchendo as prisões,
pela imposição
da arrogância,
do casuísmo e do arbítrio,
que o justo busca a razão,
reúne a coragem,
para seguir
na reta travessia.
É quando conspurca-se
a verdade,
distorcem-se os fatos,
traveste-se
e mascara-se
a memória,
com as cores do cinismo,
do embuste,
da impostura,
e urdem boatos,
e os disseminam,
para justificar a maldade
e a infâmia,
que o justo busca a razão,
reúne a coragem,
para seguir
na reta travessia.
É quando se negocia,
na calada da noite
ou à luz do dia,
a entrega das riquezas,
abjeta e infame,
abaixo e acima de onde pisamos
– dos veios das montanhas,
ao fundo do oceano –
das armas que estamos construindo,
e daquilo que chamam de mercado
(a força de quem compra,
de seu trabalho insano,
que aumentará agora,
em esforço e anos,
até pouco antes que
a morte sobrevenha)
aos estrangeiros,
que o justo busca a razão,
reúne a coragem,
para seguir
na reta travessia.
Daqueles
que vieram antes,
a poder de tempo,
de suor e de sangue
e nos legaram,
história,
terra,
vergonha na cara,
herdamos nossas cores,
nossos panos e bandeiras,
nossas lanças
e adagas,
o anseio e os planos
de grandeza e de futuro,
de Justiça,
de Pátria e Liberdade.
E a honra de pelear
a vida inteira,
por princípios,
ideias,
ideais,
mesmo quando
o que move a maioria,
é o sonho egoísta
de uma “meritocracia”,
que muitas vezes
se compra
com diploma
e concurso.
Há a nave de seguir
mar e curso,
mesmo quando
o vento for contrário.
Que venha o sal amargo
da tempestade
bater em nosso rosto,
com a força do ódio
infame e tosco,
que explode
em meio
aos relâmpagos
e trovões.
Não importam,
como ao Odisseu,
os meses e os anos,
nem os cíclopes,
nem as sereias,
canalhas,
que sussurram
em telas
e caracteres
ofertas e ilusões.
Nem que caiam
de um lado e de outro,
companheiros,
e outros emerjam
do ventre da Utopia,
da brasilidade,
da indignação
e da esperança,
para cobrir seus postos,
atrás dos remos,
das velas e escudos.
Ítaca existe,
para além dos desafios,
rochedos,
abismos,
redemoinhos,
horizontes,
oceanos.
Ítaca resiste
em cada onda,
a cada embate,
o Brasil insiste,
como estandarte
entrevisto na batalha,
gravado a fogo,
em nossos braços e punhos,
em nossas mentes
e nossos corações.
*Mauro Santayana é gaúcho, jornalista com passagens pelos principais veículos de comunicação do Brasil. Conselheiro e amigo de Tancredo Neves, foi o responsável pela articulação da campanha presidencial do então governador mineiro, em 1984, representando-o em São Paulo, o que contribuiu, em muito, para o processo de redemocratização do Brasil. Siga o jornalista no Jornal do Brasil ou em seu blog.
COM A PROA EM ÍTACA OU NOSSA ODISSEIA SEGUNDO MAURO SANTAYANA
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