O mundo da moda foi surpreendido ontem, 6, por decisão da Advertisng Standards Authority (ASA), espécie de Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar) dos britânicos, com a censura imposta à campanha de Miu Miu, a grife de moda jovem da Prada no reino da recém-nascida princesa Charlotte Diana Elizabeth. A ASA recebeu reclamação de que a foto da modelo Mia Goth, de 22 anos, passava a impressão de que tinha 16 anos e se exibia em pose sexualmente sugestiva em anúncio da grife publicado em Vogue. O processo foi aberto e ASA decidiu pelo banimento do anúncio de Miu Miu das publicações inglesas. A campanha veiculada em página dupla da Vogue UK, deixa, assim, de circular no reino de Sua Alteza Elizabeth II, a bisavó de Charlotte.
POR YUME IKEDA, DE TOKYO
A Prada é uma das grifes que mais toma cuidado em relação à exposição de suas modelos e o processo de produção de tudo que envolve a grife como com a marca Miu Miu com a qual tem buscado diálogo com o consumidor mais jovem. Tem tanto cuidado que chega até a ser, digamos assim, exagerado em vários aspectos, como a supervisão de mão de obra, o uso correto de linguagem e a preservação da imagem. Por isso, a decisão da londrina ASA pegou de surpresa o mundo da moda. Mia Goth, a estrela da campanha de Miu Miu, não é nenhuma menina, ao contrário, é modelo que tem uma carreira sólida e, aos 22 anos, está entre as mais requisitadas das passarelas. Longe de Mia ter 16 anos ainda que ela almejasse por tanto ganho de contabilidade, como qualquer mulher. Filha da brasileira Rachel, por sua vez filha da atriz Maria Gladys, Mia passou a infância no Rio de Janeiro, em Ipanema, embora tenha nascido em Londres. Ganhou muita projeção ao protagonizar o filme Nymphomaniac do dinamarquês Lars Von Trier. Isso mesmo: ninfomaníaca, despertando, sabe-se lá os desejos de muitos marmanjos, inclusive os britânicos.
Nesses processos, onde o império da burocracia e do conservadorismo jurídico fazem morada, por melhor que sejam os argumentos e até o reconhecimento deles, a conversa é meio como a de um telefone sem fio, o que fica mais evidente ainda porque ASA, em nome da transparência, publica os despachos na integra.
A própria edição britânica da Vogue enviou para a ASA a sua defesa, muito clara e que a própria ASA relata no seu despacho: “Vogue UK informou que a revista é sofisticada e seus leitores foram educados para apreciar a superioridade da fotografia de modelos de moda de grandes marcas. Eles não acreditam que seus leitores poderiam pensar que o anúncio foi feito para sugerir que a modelo era uma criança. Eles disseram que não tinham recebido quaisquer queixas de leitores diretamente”.
Prada, por sua vez, argumentou sobre a campanha de Miu Miu com o que, aliás, é a mais pura verdade, que “o anúncio era parte de uma campanha com três modelos diferentes em uma série de tableaux cinematográfica”. Veja como ASA fez o registro desse relato: “Eles disseram que as imagens mostraram vislumbres dos modelos através de portas e colocam o espectador no centro de um multidimensional e história multi-room. O anúncio contou com Mia Goth, uma atriz de 22 anos de idade e modelo. Ela foi mostrado na lençóis brancos imaculados, desgastando um equipamento sofisticado, sem maquiagem.”. Eles, Prada, não acreditam que ela foi mostrada em uma pose sexualmente sugestiva ou que havia um tom sexual para o anúncio ou a expressão dela pude sugerir.
De nada adiantou os argumentos. Eis a decisão da ASA: “O anúncio (o de Miu Miu) não deve aparecer novamente na sua forma atual. Nós dissemos à Prada SpA para garantir que os anúncios futuros não incluam imagens que inadequadamente sexualizem mulheres jovens ou que sejam susceptíveis a causar ofensa grave.”
A ofensa, é claro, é algo para lá de discutível, depende do olhar de quem a julga e se, como diz o ditado popular se, em terra de cego, quem tem um olho é rei, ver apenas uma parte pode implicar em decisões nem sempre acertadas. O futuro o dirá, só que é pena que caminhe para visões tão de penumbra, que poderia estar de fato restritas ao mundo noir da fotografia e do cinema. Embalados por bebês reais, como Charlotte, parecem que os britânicos agora veem infância em todas as faces que os rodeiam. Miu Miu.